Se alimentar é mais do que saber comer. Envolve dimensões relacionais das experiências afetivas que se constroem culturalmente aos alimentos. Quando falamos de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), compreender o ritmo de cada uma nesse processo é fundamental para promover experiências alimentares positivas, respeitosas, seguras e afetivas. A alimentação é um processo que se constrói gradualmente e cotidianamente, com respeito, rotina e paciência.
A seletividade alimentar em crianças com TEA é uma queixa frequente e, muitas vezes, angustiante para famílias e profissionais. Caracterizada por uma alimentação restrita a poucos alimentos, dificuldades com novas texturas, cores, temperaturas ou e até mesmo impactos na participação social, a seletividade pode estar relacionada a diversos fatores: sensoriais, motores, emocionais, biológicos, relacionais e até experiências alimentares negativas anteriores.
É nesse contexto que a escalada do comer aparece como uma forma de compreender o comer como um processo e não como um evento pontual. A escalada do comer é um conhecimento teórico prático que pode facilitar o planejamento, o desenvolvimento e o acompanhamento das intervenções por familiares e profissionais que almejam em ampliar o repertório alimentar da sua criança, ela consiste em:
● Tolerar o alimento no ambiente;
● Interagir com o alimento;
● Cheirar o alimento;
● Tocar o alimento;
● Provar pequenos pedaços do alimento;
● Comer – uma quantidade considerável.
Para cada etapa, é necessário uma avaliação para mensurar as habilidades da criança em realizá-la. A criança não precisa “comer logo” para estar evoluindo. Quando forçada a pular etapas, pode se sentir insegura, ansiosa ou até recusar por completo o processo. Vale salientar que as famílias tem papel fundamental para o desenvolvimento saudável desse processo, oferecendo um ambiente seguro, sem pressão e com oportunidades de experimentação. Isso inclui respeitar sinais de saciedade, acolher recusas e permitir que a criança participe da experiência alimentar de forma ativa, participativa e significativa.
Conclusão
Compreender a alimentação infantil como uma escalada – onde cada etapa é aprendida e ensinada – é reconhecer que assim como desenvolver uma nova habilidade, comer também requer aprendizado. Tocar, cheirar, tolerar a presença do alimento: tudo isso já é avanço quando olhamos para alimentação como um espectro que impacta até a participação social.Por isso, é fundamental oferecer experiências alimentares seguras, sem cobranças e com espaço para a experimentação no tempo da criança. Além do ato de comer, a intervenção da Terapia Ocupacional em casos de seletividade alimentar, se estrutura em criar condições para que a alimentação possa ser vivida com mais conforto, participação e significado.
Autor do Post:
Lua Zayra – Terapeuta Ocupacional (26142-TO), especializada em Análise do Comportamento Aplicada (ABA) e Estimulação Precoce em crianças com atrasos no desenvolvimento neuropsicomotor.
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