A Clínica Incentivo desenvolveu o Programa Eficiente de Construção de Tolerância (PECT) para ensinar habilidades como colaboração e tolerância. Com seis passos progressivos, o PECT ensina o cliente a devolver o reforçador de maneira apropriada, além de comunicação. É uma estrratégia ágil e de execução simples, como demonstrado nos vídeo e texto a seguir.
A Análise do Comportamento Aplicada (ABA) utiliza diferentes procedimentos para reduzir comportamentos inadequados e promover habilidades funcionais. Entre eles, o Treino de Comunicação Funcional (FCT) é amplamente reconhecido por ensinar respostas comunicativas apropriadas, substituindo comportamentos problemáticos por formas eficazes de comunicação. Apesar de seus resultados positivos, a manutenção a longo prazo é desafiadora, já que reforçar continuamente cada resposta é impraticável.
Para lidar com essa limitação, foi desenvolvido o Contingency-Based Progressive Delay (CBPD), que constrói tolerância ao atraso no reforçamento, tornando este atraso menos aversivo ou com base em tempos cada vez mais maiores ou com base em respostas progressivamente mais complexas. Essa abordagem foi incorporada a práticas mais compassivas, como o Skill-Based Treatment (SBT), que prioriza o bem-estar e o respeito ao cliente ao balancear reforçamento e desenvolvimento de habilidades.
Inspirado no CBPD, a Clínica Incentivo criou o Programa Eficiente de Construção de Tolerância (PECT) para atender clientes com dificuldade em devolver reforçadores, um comportamento comum que pode gerar desafios significativos. O PECT ensina habilidades como tolerância, colaboração e comunicação funcional em um formato simples e padronizado, facilitando a aplicação por terapeutas e cuidadores. É constituído por seis passos gradativamente mais complexos. O treinamento para o PECT pode ser concluído em cerca de uma hora, além de produzir resultados ágeis com os clientes. Por isso, ele parece ser uma opção interessamte para garantir maior engajamento e menores taxas de comportamentos inadequados dos clientes.
PASSOS DO PECT
Os passos do Programa Eficiente de Construção de Tolerância (PECT) são apresentados a seguir. Para garantir o avanço adequado entre os passos, é necessário que o cliente demonstre sucesso no passo atual, definido como a capacidade de cumprir cinco tentativas consecutivas com respostas apropriadas e em um estado de relaxamento e engajamento, sem emissão de comportamentos interferentes. Caso ocorram comportamentos inadequados em cinco tentativas (sequenciais ou não), recomenda-se retornar ao passo anterior. Ressalta-se que o uso de reforçadores de alta qualidade é essencial para a eficácia do PECT. É importante notar que, dependendo do comportamento do cliente, existe a possibilidade de pular alguns passos ou de iniciar o procedimento por um passo mais avançado.
Passo 1: Ensino de mando. Solicitação do reforçador e ensino de mando para mantê-lo.
O terapeuta solicita o reforçador ao cliente e, caso o cliente não deseje cedê-lo, ensina um mando simples que permita ao cliente manter o reforçador. Esse mando pode envolver apontar, vocalizar, trocar figuras, ou até uma resposta não verbal em casos de maior dificuldade. Neste passo, o terapeuta se limita a solicitar o reforçador de forma vocal e gestual, sem tocar o item. O objetivo é que o cliente substitua comportamentos interferentes por mandos apropriados como forma de indicar “não”. O avanço para o próximo passo pode ocorrer mesmo que o cliente necessite de ajuda para o comportamento colaborativo em substituição ao comportamento-problema.
Passo 2: Tocar o reforçador. Solicitação do reforçador com toque leve e reforço do mando para mantê-lo.
Este passo expande o anterior, incluindo um toque leve e rápido no reforçador ao solicitá-lo. O terapeuta continua reforçando o comportamento ensinado no passo anterior. Este procedimento molda a tolerância, com o cliente agora aceitando que o terapeuta toque no item. Além disso, se possível, são introduzidos mandos mais refinados, como uma frase mais longa. A progressão para o próximo passo é permitida mesmo que o cliente precise de ajuda para o mando ou para outro comportamento colaborativo.
Passo 3: Compartilhar o reforçador. Solicitação do reforçador e uso compartilhado por alguns segundos, com reforço do mando para mantê-lo.
Neste passo, além de solicitar o reforçador, o terapeuta o utiliza brevemente junto com o cliente. O objetivo é iniciar o ensino de compartilhamento do reforçador. Caso o cliente demonstre insatisfação e não emita o mando de forma espontânea, o terapeuta pode oferecer dicas para facilitar a resposta. Se o cliente se engajar na interação, esta pode durar até um minuto, ao final do qual o terapeuta devolve o reforçador ao cliente ou fornece uma dica para que o cliente emita o mando.
Passo 4: Entregar o reforçador. Solicitação do reforçador e auxílio para a entrega.
Neste passo, o terapeuta solicita o reforçador e posiciona a mão para recebê-lo. Caso o cliente não entregue o item espontaneamente, o terapeuta pode fornecer uma dica leve para facilitar a entrega, sem, no entanto, forçar a ação. Após a entrega, o terapeuta devolve imediatamente o reforçador ao cliente; quando possível, pode-se solicitar um mando antes da devolução.
Passo 5: Requisitar demanda simples. Solicitação do reforçador e apresentação de demanda simples após a entrega.
Após receber o reforçador do cliente, o terapeuta introduz uma demanda simples, definida como uma resposta de baixo esforço para o cliente. Completada a demanda, o reforçador pode ser liberado imediatamente, ou preferencialmente, após um mando adequado.
Passo 6 em diante: Requisitar demandas complexas. Solicitação do reforçador e apresentação de demandas progressivamente mais complexas.
A partir deste ponto, o terapeuta aumenta gradativamente a complexidade das demandas antes de devolver o reforçador ao cliente ou de estabelecer o contexto para a emissão do mando pelo reforçador.
- RESULTADOS INICIAIS
O PECT foi aplicado em quatro cliente e o desempenho deles está exibido no gráfico abaixo (com nome fictícios). Os resultados mostram que o PECT foi eficaz e eficiente na redução dos comportamentos indesejáveis para todos os participantes. Embora não tenha sido feita uma medida específica, observações indicam um aumento de mandos independentes desde o primeiro passo do PECT para Adriano, Gustavo e Lucas.
Observou-se aumento significativo na colaboração e na emissão de mandos, bem como redução de comportamentos inadequados já nas primeiras sessões. Anderson, por exemplo, passou de 0% de colaboração para mais de 70% no primeiro dia de intervenção, mantendo níveis acima de 90% nos passos seguintes. Outras crianças, como Adriano e Gustavo, também apresentaram progressos consistentes, apesar de oscilações iniciais em passos mais desafiadores.
Uma hipótese para o sucesso rápido do PECT é que as demandas para entregar reforçadores e realizar tarefas funcionavam como Operações Estabelecedoras Condicionadas Reflexivas (CEO-R), ou seja, eram aversivos que estabeleciam sua própria remoção como reforçador. O primeiro passo do PECT, que exigia pouco e não solicitava que os participantes entregassem os reforçadores de imediato, pode ter tornado o processo mais tolerável, sendo uma CEO-R menos intensa. A cada passo, as exigências eram aumentadas de forma gradual, o que ajudava a manter a colaboração dos participantes.
Este estudo apresenta algumas limitações que podem ser exploradas em estudos futuros. Primeiro, não se trata de uma pesquisa sistemática. Estudos organizados podem ajudar a avaliar melhor a validade do modelo. Apesar dos passos bem definidos do PECT, seria interessante testar variações, como um PECT aplicado a comportamentos de não compartilhar reforçadores em brincadeiras sociais. Outra limitação é que o PECT foi aplicado apenas em crianças de faixas etárias semelhantes. Expandir o uso para outros perfis ajudaria a verificar sua generalização. Além disso, seria valioso comparar o PECT com outros modelos de CBPD para avaliar eficácia e eficiência. Finalmente, testar o PECT com diferentes tipos de reforçadores, e não apenas um tipo por participante, poderia revelar mais sobre sua generalização e consistência.
REFERÊNCIAS
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Autor do post:
Dr. Robson Faggiani – Analista do Comportamento, Psicólogo (CRP 13/8413), Especialista em Terapia Comportamental e Cognitiva, Mestre e Doutor em Psicologia Experimental, BCBA-D, QBA.
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